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Re: [OT] Quérnel, kernel, etc. ad nauseum...



Cláudio,

Cláudio Max disse:
> Em Fri, 13 Feb 2004 01:24:37 -0200
> Leandro Ferreira <leandro@androle.pro.br> disse que:
>
>
>
>> já acompanhei umas discussões aqui sobre kernel, quernel, núcleo, cerne,
>> etc. E estou entrando de gaiato nessa thread (thread????, como se traduz
>> isso? réstia, fila, tripa??)
>
> Linha. Não se diz "linha de raciocínio" :-)
>
>> Se leio núcleo ou cerne tenho de gastar alguns clocks do meu cérebro
>> para lembrar o que é isso, tal o costume de pensar em kernel e de ler
>> "kernel" escrito por ai. Falar kernel eu raramente falo, por isso não
>> tenho problemas. E sinceramente, tanto faz se alguem diz kérnel ou
>> kernél. Tem gente que diz "iscô", para SCO, outros dizem "esse ce o".
>
> Isso é puro costume. Quantos ciclos você gasta pra entender disquete? E
> disco rígido? Já "performance" pra mim é mais "caro" que "desempenho".

Pois é, um modo comum de incorporar um têrmo é pelo costume. Tenho tantos
exemplos que nem caberia citar.

>
>> Sinceramente, não sei se vale a pena traduzir certas coisas.
>> Infelizmente, ou felizmente, o inglês é uma língua franca hoje em dia,
>> principalmente na informática.

Pra ser bem franco, o inglês na informática é - que me lembre agora - um
dos únicos campos nos quais ainda admito uma -  digamos - supremacia sobre
os outros idiomas. A prática prova o que eu digo. Não digo que isso seja
uma lei inexorável, etc. É um fato. O mesmo se constata em outros campos
com outros idiomas.
Existem situações em que é inviável uma "tradução" de têrmos: isso pra mim
também constitui a riqueza de um idioma: não seu empobrecimento. Seria
muito fácil concluir que a integridade de um idioma se expressa em sua
capaciade de atribuir a têrmos de lingua estrangeira seu próprio
significado: a profundidade e a riqueza subjacente de um idioma se
manifestam numa amplitude muito maior do essa. Em suma: a riqueza de um
idioma não re reduz a sua capacidade de resistir à alienação, é muito mais
do que isso.
Sabe qual a maior fonte de expansão da capacidade de um idioma?  A
línguagem cotidiana e os bons escritores. Isso é uma opinião pessoal, não
um dogma.

>
> Na verdade ela é muito mais "lingua franca" por preguiça mental ou
> "chiquê" de povão. O povo agora começou com "expertise" pra lá,
> "expertise" pra cá. Experiência, perícia ou profissionalismo não ajudam,
> TEM que ser aquilo. Poupem-me.

Nisso você tem toda razão: não existe nehum motivo plausível pra se usar
um têrmo estrangeiro em vez de um nativo quando o têrmo nativo expressa
com toda a exatidão a idéia do outro têrmo.

Eu penso que a linguagem é uma ferramenta, uma ferramenta que está a
serviço das idéias. Quando você defende a incorportação deste têrmo
traduzido "para dentro" do idioma daquí, na minha opinião você adultera o
sentido original do termo. Quernel em português não quer dizer
absolutamente nada. Em inglês quer dizer semente. Tem um significado. Se
você substitui kernel por núcleo, aí sim: a palavra núcleo tem um
significado que se assemelha a "semente", no original. Essa tradução -
apesar do som que ela produz não ser tão parecido quanto aquele em inglês
- é perfeitamente legitima e satisfaz completamente a necessidade de
expressão da idéia de kernel como sendo o centro, o núcleo do sistema
operacional.

>
>> Acho detestável quando leio material em português com siglas e tudo o
>> mais traduzido. Ai vc consulta um material em inglês e tem que ficar
>> fazendo ping pong mental.
>
> Detestável por que você sabe o que é em inglês. O problema costuma ser
> esse: ou "dane-se" quem não sabe, deveria por ser da área, ou

Essa tendência tende a se diluir com o passar do tempo. Essa postura
reacionária levada ao extremo teria como consequencia o sujeito
envergonhar-se de falar ou entender outro idioma. Isso tem um nome:
chama-se xenofobia.

>
>> Quando fazia Karate, ou caratê, tinhamos os nomes dos
>> golpes em japonês. E todo mundo falava os nomes em japonês, todos os
>> livros, mesmo em português, tinham os nomes em japonês. Mawashi geri,
>> era chute lateral se não me engano. Se vc falava "dê um chute lateral",
>> ninguém entendia. Mas todos sabiam o que era um mawashi. Até nos livros
>> em inglês os nomes eram em japonês. No mundo todo os praticantes tinham
>> essa uniformidade, pelo que me diziam os meus professores.
>
> Suponho então que quando, na rua, você fala que um sujeito deu um chute
> lateral no outro você diz: "então fulano deu um mawashi gueri no outro e
> aí..." É isso mesmo? Você usa termos do caratê na conversa cotidiana?

Se o outro praticar karatê, não tem nenhum problema: ele vai entender
exatamente o que o outro diz. Isso também confirma o que disse acima:
somos ninjas. Praticamos linux.

>
>> E eu acho isso algo positivo. A nossa língua portuguesa não vai
>> esfarelar por causa disso. Cada área de conhecimento tem o seu jargão
>> próprio.
>
> Esfarelar, não. Mas vai empobrecer. Alguém para pro cafezinho? Não, agora
> vai-se para o coffe-break. O CEO estuda o TCO e o ROI da empresa
> preocupada com o dumping. Os mac-jobs caindo por causa da crise no
> fast-food.

É verdade. Mas o bom peão faz passar pela porteira o boi que ele quer
deixar passar, não a boiada inteira. Se não ele não seria um bom peão.
Tem que ter critério, se não vira uma zona. Eu já fui militar. É proibido
falar num idioma estrangeiro dentro do quartel. Isso é uma questão de
segurança. Apesar disso, a parte debaixo do motor da viatura continua a se
chamar "carter", e você dizendo isso não é considerado espiao ou vai parar
na cadeia.

>
> Cada vez que uma palavra em inglês substitui uma em português, a qual tem
> um similar, esta passa a segundo plano e, com o tempo morre, existindo
> apenas no dicionário.
>
> Nos últimos dias, quantas vezes você usou "performance"? Há quanto tempo
> não diz "desempenho"? Desempenho já é uma palavra semi-morta.
>
> Atentamente
>
> Cláudio
>


BRASIL!


RSalles


-- 
"A well-written program is its own heaven; a poorly-written program is its
own hell."
TAO of Programming - Book 4

Tradução: Um programa bem escrito é seu próprio paraíso, um escrito
pobremente, seu próprio inferno.

TAO da Programação - Livro 4



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