por Alexandre
Garcia Publicado na Gazeta de Cuiabá -
MT
Domingo
cedo eu ia de táxi de Ipanema ao Aeroporto do Galeão e, antes de entrar no
túnel Rebouças, o motorista festejou: "Estamos com sorte; o túnel está
aberto." Ainda pela madrugada, o túnel fechara mais uma vez, porque
bandidos interrompem o tráfego para roubar carros, armados de fuzis
automáticos e metralhadoras. Significativamente, o túnel passa abaixo dos
pés do Cristo Redentor. Na quinta-feira à noite, eu havia feito uma
palestra no Hotel Sheraton, em frente à favela do Vidigal, e até uma hora
antes não se sabia se a Avenida Niemeyer estaria bloqueada ou não pelos
tiroteios. Quando cobri a guerra no Líbano, em 1982, não imaginei que iria
encontrar situação semelhante na Cidade Maravilhosa, em pleno século 21. E
como reage o governo? Tentando desarmar as pessoas de bem, que têm armas
para sua legítima defesa.
Dos milhares de armas que as pessoas
entregaram, algumas caíram em mãos dos bandidos. Sabe-se de 83 dos
melhores exemplares - algumas já encontradas para confirmar a troca de
mãos. Não se sabe do resto. As velhas, enferrujadas, das viúvas, já
passaram pelo rolo compressor. Diz-se que as armas estão sendo recolhidas
para que não caiam nas mãos dos bandidos... Enquanto isso, em São Paulo,
no bairro chique de Itaim, quase 30 edifícios já foram assaltados sem
pressa. Os bandidos entram e ficam seis horas a vasculhar os apartamentos,
com a confiança de que não haverá reação porque, afinal, as pessoas não
têm armas para defender seus lares. No meu estado natal a gente aprende
que se nos agachamos, alguém vai acabar nos montando.
Não vejo
problema em implantar o maior rigor no registro de armas. Exame de
equilíbrio emocional, de ficha policial e de adestramento no manejo da
arma são necessários. Mas não vejo por que impedir o cidadão de exercer o
elementar direito da legítima defesa. Além disso, proibir venda de armas
de nada vai adiantar, porque o bandido não compra arma na loja, mas na
ponta do tráfico. Desarmar pessoas de bem não é vantagem alguma. O Estado
precisa é desarmar o bandido. Que, no Brasil, não toma armas das
residências das famílias mas dos quartéis do Estado. As outras vêm do
exterior, no contrabando. Vamos gastar 600 milhões de reais com o
referendo. E se esse dinheiro fosse aplicado em equipar e treinar
policiais?
Pesquisa da semana passada mostra o pavor que impera nas
capitais. Em Belém, três em cada cinco famílias declaram viver em área
sujeita à violência ou vandalismo. No Rio, duas em cada cinco. O índice
menos ruim é o de Brasília: uma em cada cinco famílias declara-se moradora
de área de risco para a segurança. Vinte por cento! Nosso índice mais
baixo de violência deve ser parecido com o do Iraque, onde todo mundo anda
armado. Aqui se mata mais, sem dúvida. Mais de cem por dia. Nessa guerra,
em vez de desarmar o atacante, tratamos de desarmar a vítima.
Vai
nos restar o carro blindado, a grade nas portas e janela s, as câmeras de
big-brother orwelliano, a folha de pagamento dos seguranças, o colete à
prova de balas. E o medo. De que lado está o Estado? Se quiser todos
desarmados, que reforme a Justiça e a polícia, para termos lei e
segurança.
Brasileiro com medo não é cidadão; é
súdito. |